Vidas Negras Importam


Artigo preparado por Raíra Cavalcanti, com base no K9 Meeting, realizado em Junho de 2020.


A verdade, meu irmãos e irmãs, é que o sonho do reverendo Martin Luther King Jr. ainda não se realizou.

A Igreja Batista Emanuel em Boa Viagem realizou pelo Youtube uma live, no dia 9 de junho de 2020, sobre a temática do racismo, dando um passo no reconhecimento de seu papel antirracista, bem como de seu próprio racismo (seja ele intencional ou por negligência, desconhecimento, ignorância ou desatenção).

A Bíblia não ignora a diversidade de raça e nem a trata como desimportante. Pelo contrário: a raça é ressaltada e celebrada como a pluralidade e diversidade da criação divina. Já o racismo, a discriminação de uma raça de forma consciente ou inconsciente, direta ou indireta, que segrega socialmente, é um pecado que fere ao Criador. 

Por isso, precisamos entender a nossa responsabilidade como cristãos no aqui e no agora.

Antes de tudo, é importante saber que racismo não é somente uma ação individual, ele é uma estrutura social construída e reforçada. É uma teoria, um pensamento racional histórico que colocou um grupo específico colonizador, o branco e europeu, como controlador da totalidade do ser ou do estar do não-branco, do diferente e não-evoluído, do outro.

O Brasil teve um passado baseado na escravização de vários pretos e pretas africanas. E, mesmo no séc. XIX, com a abolição da escravatura, pessoas negras “libertas” nunca foram inseridas na sociedade. A pessoa negra partia de um lugar no Brasil, legitimado pela própria lei, de desvantagem. Essa desvantagem de 300 anos de escravidão ainda não foi superada em 132 anos de alforria.

Como falar de meritocracia se aqueles que descendem de todo um cenário de escravidão começam de um lugar que está atrás quando comparado ao lugar de quem possui direitos ou privilégios relacionados à cor de pele?

Não podemos achar normal quando vemos as relações de poder sem que haja representação negra. Onde estão os negros políticos de um país que possui 52% de população negra? Por que na formatura de cursos tradicionais, como medicina, direito e odontologia, praticamente não há negros? Por que pastores negros estão nas igrejas da periferia, mas não são convidados para pregar num domingo à noite em igrejas de classe alta?

A importância da representatividade consiste em poder olhar para alguém como você e pensar que é possível chegar lá, alcançar aquele lugar onde a pessoa está. É cruel quando tudo na sua vida parece impossível e conseguir coisas básicas é como bater um recorde. 

A violência também se manifesta na ausência de representatividade. Violências física e verbal diretas são apenas algumas das formas de manifestação de racismo, o qual também se revela na segurança pública, na conduta policial, na estética, no planejamento urbano, no mercado de trabalho, na invisibilização intelectual, na ultra-sexualização da mulher negra, na teologia, na linguagem, na perda de direitos difusos e subjetivos, nas igrejas...

Qual a cor do lápis cor-de-pele? Qual a cor das pessoas inocentes e de bem? Qual a cor do príncipe encantado? Qual a cor dos atendidos em projetos sociais? Qual a cor dos encarcerados em presídios? Qual a cor das lideranças do país? Qual a cor dos moradores dos morros, favelas e comunidades? Qual a cor dos magistrados e desembargadores? Qual a cor dos membros da nossa igreja?

 

Precisamos trilhar caminhos de restauração. Conhecer a história, reconhecer a estrutura, entender, ler, não se alienar, estarmos prontos para ouvir. Somos rápidos para diagnosticar, dar rótulos e solucionar; mas precisamos ouvir, sentir a dor do próximo e exercer a empatia.

Temos que repensar o que falamos, o que fazemos, como olhamos, que incentivos damos, se reforçamos diferenças que não deveriam existir, com o que fazemos “piada”, o que usamos como elogio e como xingamento. Precisamos pregar sobre Deus com nossas palavras e nossas ações.

Precisamos contar uns com os outros para confessarmos nossos pecados e nos reconhecermos racistas. Admitir nosso erro de ter feito coisas que talvez nem tivéssemos a intenção de fazer, mas pelas quais somos responsáveis. Temos que verdadeiramente nos arrependermos delas.

Não podemos ser indiferentes. Não podemos ser indiferentes como igreja. Como falamos de um Jesus que é justiça, paz e amor para pessoas que todos os dias lidam com injustiça, violência e ódio? Não podemos nos esquivar dos problemas do mundo, mas sim seguir o exemplo de Jesus que, como servo, se esvaziou por completo e abraçou os maiores problemas da humanidade. 

Nossa missão não é exigir dos outros amor e perdão, o nosso papel é pedir perdão e oferecer amor. A igreja precisa dar a outra face. Nossa oração é no sentido de que, enquanto estivermos aqui, sejamos instrumentos do Senhor para que o poder dEle atue em nós e traga a paz, a justiça e a verdade.

A verdade, meu irmãos e irmãs, é a de que todos precisamos sonhar o sonho do reverendo Martin Luther King Jr.

Para acessar a live, basta clicar aqui.